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segunda-feira, 3 de maio de 2010

Conferência Mundial dos Povos sobre as mudanças climáticas e direitos de la Madre Tierra na Bolívia


Recebemos de Marianne Spiller o artigo abaixo, escrito com Ivete Caribé da Rocha, e o publicamos na íntegra. Marianne Spiller e Ivete Caribé da Rocha participam do Serviço de Paz e Justiça da América Latina – SERPAJ Brasil, e participaram da importante Conferência de Cochabamba.

Eis o artigo.

A Conferência Mundial dos Povos sobre as mudanças climáticas e pelos direitos da “Madre Tierra”, que aconteceu em Cochabamba, na Bolívia, entre os dias 19 à 22 de abril do corrente ano, representou um impressionante despertar de consciências sobre a gravidade da destruição da natureza, quem são os causadores e as vítimas dessa destruição. Representou também, a descoberta de uma cultura originária que não conhecíamos. Encontrar os povos indígenas latino-americanos, sobreviventes da pós-colonização, hoje ocupando espaços decisivos em muitos países de nosso Continente, seja ocupando cargos públicos, como no governo da Bolívia, seja representando importantes movimentos sociais, foi também uma mudança de visão, muito diferente dessa que a mídia em geral, tem tentado nos impor. Foi emocionante, ver o grau de conhecimentos acerca da natureza e o respeito desses povos a tudo que a “Madre Tierra” nos proporciona, sua visão holística do Cosmos, com o entendimento de que a terra não nos pertence, mas nós pertencemos à ela.
A chegada ao Aeroporto de Santa Cruz de La Sierra, primeira conexão de nosso vôo em terras Bolivianas, ainda nos mostra resquícios de um tempo de dominação dos colonizadores e da indústria consumista, com seus imensos painéis de produtos e modelos européias, exibindo a última moda do mundo.
As conferências realizaram-se na Cidade de Tiquipaya, que é próxima a Cochabamba, na sede da Unavalle, uma bela universidade construída ao pé das Cordilheiras, que cercam a Província de Cochabamba.
O Presidente Evo Morales Ayma, abriu a Conferência, com a presença de autoridades de vários Países de cinco Continentes e Movimentos Sociais de 142 Países, num imenso colorido de bandeiras e vestimentas dos povos originários da América Latina, de músicas e danças típicas e de uma cerimônia religiosa indígena, mostrando a origem aymara do Presidente.
O processo histórico de mudanças na Bolívia e a sua liberação dos processos colonizadores, foi até a chegada do Presidente Evo Morales, muito tênue. Os povos originários da Bolívia, como de resto, os da América Latina, foram, ao longo dos processos de colonização, massacrados e humilhados, tornando-se tristes e cabisbaixos, impedidos até mesmo de passar por logradouros públicos nas Cidades, como nos contaram em Cochabamba. Povos que nunca tiveram qualquer participação na vida política de seus países, sendo, ao longo da história, submetidos a toda espécie de humilhações, violências e saques indiscriminados de seus recursos naturais, sobrando-lhes apenas miséria, doenças e muita tristeza.
Mas, eis que um mundo novo de esperança de bem viver e de reparações dessas injustiças, descortinou-se com a chegada do governo participativo de Evo Morales Ayma, primeiro indígena a governar a Bolívia. A começar pela nova denominação de “Estado Plurinacional da Bolívia”, cujo significado é a efetiva participação pluríme dos povos originários nas decisões governamentais, ao lado dos demais bolivianos.
Seu lema do “Viver bem”, é viver em igualdade, solidariedade, complementaridade, harmonia e respeito à dignidade de cada povo. É reconhecer que não somos os donos da terra, mas que pertencemos a ela, com a obrigação de defender os direitos dessa “Madre Tierra”.
Essa forma de viver, mostrou-se bem presente entre os povos originários, cuja participação em todas as discussões e palestras da Conferência foi muito significativa, fruto da eliminação do analfabetismo na Bolívia, ao final do primeiro mandato de Evo Morales. Pudemos ver o grande interesse demonstrado pelos povos originários nessa Conferência, com propostas efetivas e pertinentes intervenções, além do seu alto grau de conscientização política e conhecimento da atualidade internacional.
As discussões dessa importante Conferência, foram bastante objetivas e mostraram os enormes danos ambientais causados pelos exploradores dos recursos naturais do Planeta, que, à título de impulsionar o desenvolvimento, apenas visam o lucro desmesurado para alimentar o grande capital, provocando o desequilíbrio da natureza e por conseqüência, as graves catástrofes que temos presenciado nos últimos tempos, sendo vítimas desses desastres, quase sempre, as camadas mais pobres das populações.
Palestras de renomados ambientalistas, como Leonardo Boff, Frei Beto, Naomi Klein e Miguel D’Escoto, nos ensinaram que não há como persistir o modelo capitalista vigente, com sua política egoísta de acumulação de riquezas, avançando e destruindo a natureza, nossas águas, mares, ar e terra. Essa terra, chamada pelos indígenas de “Pachamama”, ou Mãe Terra. Leonardo Boff, comparou a Terra a uma mãe que supre as necessidades de seus filhos. Então, como maltratamos e desrespeitamos a essa mãe tão generosa? Por isso, foram estabelecidos nessa Conferência, os Direitos da Mãe Terra e reiterado que o dia 22 de abril, será o seu dia internacional.
Concluiu-se também, através de uma das Mesas de Discussões, a criação de um Tribunal Internacional de Justiça Climática e Meio Ambiente, ideia já defendida por Adolfo Pérez Esquivel – Prêmio Nobel da Paz de 1980, no Fórum Mundial de Meio Ambiente, em Veneza em 2009, sob o fundamento de que os crimes ambientais sejam tratados como de “lesa humanidade”. A Campanha pela criação da Corte Penal de Meio Ambiente, foi lançada em novembro de 2009, no Memorial da América Latina, em São Paulo, sendo impulsionada pelo Serviço de Paz e Justiça da América Latina – SERPAJ. É de suma importância a conclusão pela criação do Tribunal Internacional de Justiça Climática, representando um grande passo, para que a final venham a ser punidos criminalmente e responsabilizados civilmente, os causadores das agressões ambientais, através de um órgão especializado.
Foi emocionante ver a gratidão e o amor do povo pelo Presidente Evo Morales Ayma. Saber de sua conduta ética, moral e humanitária, que seu alvo principal é o bem estar de seu povo, mesmo que para isso, passe noites trabalhando e dialogando para compor as divergências, sem perder de vistas, a sua atuação em prol de toda a humanidade, exemplo a ser seguido por outros governantes.
Como disse Eduardo Galeano: “é preciso recontar a história dos povos latino- americanos, para que uma nova história seja escrita”. Evo Morales escreve uma nova história na Bolívia, com a força dos movimentos sociais e dos povos originários, verdadeiros cuidadores da terra e das riquezas naturais de seu país.

Colhido do Instituto Humanitas UNISINOS
3/5/2010

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